PUBLICAÇÕES

Frente aberta para subir no palanque

Ao contemplar a conjuntura atual referente aos juros no mundo, uma coisa é certa como o céu azul: ao longo deste ano de 2024 teremos ao redor do globo, excluindo o fenômeno nipônico, um fluxo de rebanho seguindo a mão invisível que pastoreia os âmbitos dos bancos centrais em reduzir juros.

A pergunta de US$ 1 bilhão reside no “timing”. E isso muito tem a ver com o quão bem-sucedido tem sido o plano de recuperação das principais economias do planeta. Se olharmos para o “quintal de casa”, ainda que sigamos, assim como os outros latino-americanos, o humor do Tio Sam, nossos dirigentes monetários conseguiram de forma exemplar se antecipa aos “tubarões” e tornar o perfil do nosso enfrentamento ao fantasma inflacionário pacífico como os gigantes azuis que residem nos oceanos.

Temos no cenário Brasil muito bem estabelecido o início do ciclo do corte de juros (a largada já foi dada) e, salvo riscos sistêmicos como um colapso mundial ou o total descompasso do equilíbrio interno, um plano de voo estabelecido e o famigerado pouso suave no horizonte.

Todavia, ao atentarmos ao Velho Continente, notam-se como os conflitos em evidência neste momento e a “patinação no gelo” que tem sido frear os consequentes custos de energia e alimentos, entende-se o motivo pelo qual precificar o ciclo de cortes não é uma tarefa trivial e como o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, está obrigando os críticos o engolirem a seco. O mandato de Campos Neto, não custa lembrar, vai até o fim deste ano.

Eis então que, para dissecarmos o racional do Federal Open Market Committee (Fomc), é vital pairar a análise com embasamento prioritário no que ocorre no mundo e os conflitos que os americanos compraram, para poder então justificar as dores de cabeça de Jerome Powell e a clara ineficácia de seu time em segurar a economia na crista da onda. Hoje, os Estados Unidos demonstram tortuosidades em eliminar a inflação sem nocautear a produtividade nacional.

Com dados conflitantes perante o sossego dos preços e os níveis de desemprego, existe um meio termo em que, cada vez mais provável estatisticamente, o ciclo de cortes americano não virá com tanto imediatismo como um dia fora prometido, e nem com a lentidão de um distante 2025. Enquanto na Europa se esperam maiores prazos, os EUA criaram esse sentimento mundial dos mercados de expectativa pelo “Dia D” dos juros, que prejudica sua própria recuperação, enquanto de forma realista o mesmo só virá a partir do meio do ano. Entre idas e vindas dos juros, não só de política monetária respiram os mercados.

Se focarmos minuciosamente, choques de oferta na produção global também corroboram para esta pavimentação mal feita de uma via para o “boom” necessário. Divisões políticas que remetem a dias mais sombrios da humanidade e gargalos na disponibilidade de commodities-chave – tais como o petróleo – arquitetam novos tempos na ordem político-econômica do globo. Blocos como o Brics, que antes eram coadjuvantes no tabuleiro, conquistam o estrelato com o peso das maiores economias/populações nas costas, de forma a ameaçar a antes indiscutível soberania dos ianques no planeta.

E, em meio a isso tudo, não há como se evitar de comentar que nós, tupiniquins, celeiro do mundo, exportadores de minério, provedores de recursos aos chineses e intermediadores da dualidade econômica que se constrói no mundo, temos a frente aberta para subir no palanque e tomar as rédeas da nossa relevância nisso tudo. O bilhete dourado para se sentar na mesa dos adultos caiu no colo da pátria amada, e a responsabilidade de não desperdiçar essa realidade de fraqueza global com nossos próprios tropeços também.

Até o presente momento, o Brasil sucedeu em se descolar dessa confusão morfológica e perpetua sua solidez monetária. Mas seria um grande infortúnio crer veementemente que não seja necessário manter dois olhos arregalados para os próximos passos do norte político global. Afinal, como dito à exaustão no mercado financeiro, “no Brasil até o passado é incerto”. Nademos como uma baleia azul, com a virtuosa adaptabilidade e “escaldo” de um peixinho dourado.

Alex Silva é sócio da Aware Investments
E-mail: alqsilva@awaregestao.pt

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

 

Fonte: Valor Econômico

Por: Alex Silva

 

Voltar