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Entenda por que o simpósio de Jackson Hole é importante para os mercados globais

A expectativa encontra explicação na iminência do anúncio do processo de redução dos estímulos dados pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA)

Começa oficialmente nesta quinta-feira, 26, o Simpósio de Jackson Hole, evento sempre esperado com ansiedade pelo mercado financeiro global, mas especialmente neste ano.

A expectativa encontra explicação na iminência do anúncio do processo de redução dos estímulos dados pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), evento conhecido como “tapering”. Nele, o Fed reduz paulatinamente o volume de compras de ativos, hoje em US$ 120 bilhões, divididos em US$ 80 bilhões em Treasuries (títulos do Tesouro americano) e US$ 40 bilhões em MBA (títulos atrelados a hipotecas).

A ata da última reunião do Fed, divulgada no dia 18 de agosto, pôs mais enha na fogueira das expectativas para Jackson Hole. No documento, soube-se que mais membros do comitê decisório do banco central dos EUA (Fomc) estavam dispostos a apoiar o início de um processo gradual de aperto monetário a partir do fim deste ano.

Embora a data oficial de início seja nesta quinta, com a divulgação da programação completa, o evento começa pra valer na sexta-feira, 27, às 10h, quando o presidente do Fed, Jerome Powell, fará o discurso de abertura. Sua fala pode catalisar movimentos nos mercados financeiros globais caso forneça sinais mais claros dos próximos passos da autoridade monetária americana.

O tema título deste ano é “Política macroeconômica em uma economia desigual”.

Mas, por que tanta expectativa sobre Jackson Hole já que Powell e outros membros do Fed discursam frequentemente em vários eventos?

Influência e história

Realizado desde 1978 e organizado pelo Fed de Kansas, um dos vários Feds regionais dos EUA, o simpósio de Jackson Hole é um evento anual que se notabilizou ao longo do tempo por ser um oráculo sobre o futuro da política monetária global. Isso se fortaleceu em 1989, quando o ex-presidente do Fed Alan Greenspan passou a exercer um papel central no evento que teve como tema central os “problemas de política monetária na década de 1990”.

A partir de então, o “buraco do Jackson”, uma vila cercada por montanhas localizada em Wyoming, tornou-se o evento preferido de líderes de bancos centrais ao redor do mundo. O simpósio, contudo, também é frequentado por ministros de finanças, economistas, acadêmicos, investidores e participantes do mercado financeiro, além de autoridades do governo americano.

Neste ano, pela segunda vez seguida, o simpósio será realizado em formato virtual devido à pandemia de covid-19. Até a semana passada, esperava-se que a edição de 2021 fosse realizada presencialmente, mas os temores com a variante delta levaram o Fed de Kansas a mudar o plano.

Em edições anteriores, Jackson Hole antecipou cenários econômicos e monetários. Em 2007, por exemplo, o tema “Habitação, financiamento habitacional e política monetária” pareceu enfadonho, mas logo depois começaram a surgir os sinais mais claros do que veio a ser a Crise Financeira Global de 2008 e quem não acompanhou se arrependeu.

No ano passado, também foi em Jackson Hole, mesmo que virtualmente, que Powell apresentou uma nova estratégia sobre o regime de metas de inflação, anunciando que a partir dali o banco central americano estaria disposto a tolerar um nível de inflação acima de 2% no curto prazo, implementando uma taxa média de inflação que está em vigor no momento.

Aperto monetário ou continuação do QE?

Existe uma grande expectativa dos agentes financeiros em relação ao futuro do programa de compra de ativos do Fed, também conhecido como flexibilização quantitativa (‘QE’, na sigla em inglês). Desde o ano passado, para manter a liquidez no sistema financeiro em meio ao impacto da pandemia, o banco central dos EUA compra US$ 120 bilhões.

A questão é que, com a recuperação da economia americana nos últimos trimestres, o Fed já vem debatendo cuidadosamente o melhor momento em que esse programa, que funciona como uma espécie de impressão artificial de dinheiro, deve começar a ser reduzido.

Conforme divulgado na ata da última reunião de política monetária do Fed, a maioria dos membros da diretoria, que têm voto sobre as decisões de política monetária ainda achava que o momento certo para começar a reduzir as compras de ativos é no início do ano que vem.

Porém, aumentou o apoio entre os que passaram a defender um aperto monetário gradual já a partir do fim de 2021. Com isso, gerou-se a expectativa de que Powell pode ter guardado para Jackson Hole o anúncio da data em que o banco central americano reduzirá o QE.

O foco está concentrado em uma possível redução das compras de títulos e hipotecas, mas nos últimos dias as apostas sobre o anúncio de uma data diminuíram diante dos temores com os efeitos da variante delta da covid-19 na atividade econômica.

Também é importante destacar que, mesmo que alguma novidade seja dita, apenas a data para o início do aperto monetário deve ser sinalizada, e não um início imediato.

No dia em que o evento começa, a maioria das apostas indicam que mesmo esse anúncio prévio não será mais feito na transmissão virtual de Jackson Hole.

“Esperamos que o presidente Powell reconheça o forte crescimento do mercado de trabalho nos últimos meses e os riscos negativos apresentados pela variante delta. Isso manteria as expectativas no caminho para um possível aviso em setembro e um anúncio da redução [das compras de ativos] em novembro”, afirmam economistas do Goldman Sachs em relatório.

Não se trata de aperto de juros

Vale lembrar também que não está em discussão, até o momento, uma mudança na taxa de juros americana, atualmente entre 0% e 0,25%. Uma alteração nos juros está prevista apenas para 2023, segundo a mediana da visão dos membros do Fomc, portanto, após o fim das compras de títulos.

Evitando o “Taper Tantrum”

Todo o cuidado do Fed para anunciar uma redução no programa das compras de ativos ocorre para evitar a repetição do que houve em 2013, quando o ex-presidente do BC americano Ben Bernanke pegou o mercado de surpresa ao comunicar o fim da política monetária expansiva do iniciada em 2008 com o objetivo de combater a crise financeira global.

Os investidores reagiram mal ao “tapering”. Antecipando uma depreciação dos títulos do governo americano que tinham em mãos, o mercado vendeu Treasuries massivamente, o que fez os juros desses papeis dispararem no mercado secundário. Sempre bom lembrar, que no mercado de títulos, quando os preços caem, os juros sobem.

A birra (‘tantrum’, em inglês) se espalhou para os mercados de ações e afetou também as commodities, que perderam valor no mercado internacional e prejudicou o andamento de economias emergentes, como o Brasil.

Por isso, o Fed agora faz um esforço muito maior em sua estratégia de comunicação para preparar o mercado e evitar um novo “taper tantrum”, ou seja, um sell-off generalizado nos mercados globais.

Fonte: Valor Investe

 
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