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Entenda os riscos e oportunidades que especialistas veem para a bolsa em 2022

Olhar pelo retrovisor e observar a perda de 12% registrada pelo Ibovespa no ano passado pode não animar muitos investidores. Mas tanto as estatísticas históricas quanto as projeções dos analistas apontam para a probabilidade maior de ano positivo no mercado de ações brasileiro em 2022, a despeito da expectativa de que a economia real fique praticamente estagnada e de um cenário recheado de incertezas tanto aqui dentro como no exterior.

Um alerta, importante, porém é que exatamente esses fatores negativos e riscos que permeiam o ambiente é que devem diferenciar quais empresas e setores devem ser os vencedores ou perdedores na bolsa.

Depois de fechar o ano na casa de 105 mil pontos, o Ibovespa encerrou a sexta-feira mais próximo de 109 mil, e o entendimento é de que os fundamentos das empresas teriam condições de levá-lo ainda mais para cima até o fim do ano. Para o Santander, por exemplo, é esperado que o Ibovespa chegue a 125 mil pontos no fim deste ano, o que equivaleria a 19% de retorno em um ano completo. Mas não sem esforço e solavancos no caminho. “Reconhecemos que 2022 será turbulento e volátil por ser ano eleitoral. Além disso, o ciclo de lucro das empresas da bolsa tende a se normalizar. Isso significa que as empresas de commodities, minério de ferro, petróleo, que puxaram 2021, podem ter desempenho menor com a normalização do ciclo. Acreditamos em queda de 11% na média de lucro das empresas em relação ao ano passado”, explica o estrategista de ações da Santander CorretoraRicardo Peretti.

Mesmo assim, ele diz que o valor de mercado da bolsa brasileira está baixo em termos históricos e “parece atrativo demais para ser ignorado”. A tese é a de que uma parte dos eventos negativos, como a PEC dos Precatórios, a preocupação fiscal e o cenário de inflação já está embutida nos preços das ações. “Dado a pontuação da bolsa hoje, a relação entre o valor de mercado e o lucro previsto para os próximos 12 meses está em 7,8 vezes, abaixo da média histórica de 11,5 vezes. É esperado que esse indicador fique abaixo da média histórica pela situação atual, mas faria sentido que estivesse em torno de 9,5 vezes. Ou seja, está barata demais para ser ignorada”.

André Carvalho, chefe da área de pesquisas econômicas do Bradesco BBI, conta que a casa acredita em um Ibovespa próximo a 130 mil pontos em 2022, o que representaria um retorno de 24% em relação ao fechamento da virada do ano. “Mas essa perspectiva está muito dependente do desfecho das eleições para presidente em outubro”, pontua.

Ele explica que a preocupação do mercado financeiro e dos investidores é menor com os candidatos ao cargo em si, mas sim com a política econômica que futuro presidente vai implementar. “A pergunta-chave é se o ajuste fiscal vai continuar ou não”, aponta. “Se a resposta for que vai continuar ajuste fiscal em 2022 e depois das eleições, a gente pode ter a bolsa voando”, completa.

Segundo os cálculos feitos pela equipe do Bradesco BBI, hoje o cenário é mais positivo. No jargão, eles dizem que as probabilidades são assimétricas com viés positivo para a bolsa numa proporção de 4 para 1. Ou seja, se tudo der errado, o investidor perderia 1; se der certo, ganha 4. “É uma proporção muito grande para ser ignorada e reflete o valuation (soma do valor de mercado das empresas) da bolsa, que está muito barato”, explica. “Será que vai continuar barata por muito tempo, e é melhor aplicar em juros mesmo, ou terá um catalizador que vai fazer que suba bastante? O principal catalizador que vejo é o desfecho eleitoral, e (o mercado está) menos preocupado com o nome, e mais com a política eleitoral após eleições”, explica.

As estatísticas também jogam a favor de um Ibovespa no campo positivo em 2022. A repetição de dois anos seguidos de bolsa no vermelho não seria fato inédito no Brasil. Mas um estudo do professor Carlos Heitor Campani publicado recentemente no Valor Investe, e com base em dados dos últimos 20 anos e índices de sete bolsas de diferentes países, aponta que essa dobradinha é improvável. O trabalho mostra que, de 2002 a 2020, houve um total de 34 rentabilidades anuais negativas para as sete bolsas analisadas. E em 30 oportunidades quem apostou na bolsa no ano seguinte teve retorno positivo.

Oportunidade – Commodities

Mas embora a gente se acostume a falar tanto de “bolsa” e “Ibovespa”, vale lembrar que existem dezenas de empresas por trás desses termos e indicadores, de setores econômicos distintos e com desempenhos operacionais possivelmente discrepantes.

E é por isso que o comportamento das ações dessas companhias também deve ser visto caso a caso. As empresas com exposição a commodities, por exemplo, têm uma tendência de alta em 2022 pela demanda vinda da retomada da atividade econômica em âmbito global, segundo Rafael Panonko, analista chefe da Toro Investimentos. Em entrevista no fim do ano passado, ele dizia que seria bom observar a dupla Vale e Petrobras, que pode continuar sendo beneficiada e contribuem fortemente para o Ibovespa.

“A Vale, por exemplo, tem uma gestão operacional muito boa e diferenciais em seu produto – o minério de ferro da Vale é negociado com prêmio no mercado. Seu principal cliente é a China, que cresce em ritmo mais acelerado que outros países. Além disso, ela está sempre reportando bons resultados e pagando bons dividendos. Ou seja, no médio e longo prazo, é uma ação para ter na carteira”, pontua.

No caso da Petrobras, ele diz que, mesmo que haja um risco de intervenção governamental na estatal para mudar a política de preços, esse risco já está no preço do papel. “A empresa hoje é diferente do que foi no passado, é mais eficiente, tem margens de lucro maiores, pagou um valor alto de dividendos em 2021e negocia com desconto em relação a seus pares internacionais”, reforça Panonko.

Para Jennie Li, estrategista da XP, é preciso, porém, subdividir o setor exportador para avaliar como pode ser o ano que vem. “O agronegócio, por exemplo, tem potencial menor de alta. Teve bons resultados em 2021, mas nas conversas com analistas percebemos os números podem não se sustentar ano que vem. Não chegará a ir mal, mas talvez sua performance seja um pouco menor do que outras commodities, como minérios e metálicas”, diz.

Oportunidade – Empresas de Valor

Ainda na tentativa de separar o joio do trigo, mas com outra perspectiva, Victor Natal, estrategista de ações para pessoas físicas do Itaú BBA, destaca que a estratégia mais acertada na bolsa este ano será apostar nas chamadas “empresas de valor”, mais resilientes aos solavancos da economia doméstica e que são menos sensíveis à variação das taxas de juros de longo prazo, dado que já geram caixa no presente. “As ‘empresas de valor’, que mostram fluxo de caixa, devem ir melhores neste cenário do que as ‘empresas de crescimento’. Isso porque elas não dependem de uma tese de crescimento para, no futuro, gerar caixa”, explicou ele em entrevista concedida no fim de 2021.

Outro guia que pode levar a melhores investimentos no ano, em sua opinião, é o chamado “beta”, indicador que mede a correlação histórica da variação da ação com o Ibovespa. Num exemplo, se no dia que o Ibovespa sobe 1%, aquela ação quase sempre sobe mais, ela tem um “beta” mais arriscado, já que no movimento de baixa o comportamento será semelhante. Já se quanto o Ibovespa avança 1% ela sobe menos, o beta é inferior a 1 e a empresa é considerada mais “defensiva” na bolsa. “O que vemos nessa perspectiva são setores como o de papel e celulose, que é exportador e defensivo, e o de proteína animal, que deve continuar indo bem por uma parte de 2022”, adiciona, citando empresas que costumam ter “betas” mais baixos. Natal inclui nesse grupo também as empresas de serviços públicos, como as fornecedoras de energia, saneamento e telefonia. Entre essas últimas, as de energia são as preferidas do BBA, dado que o banco acredita na melhora do nível dos reservatórios e destaca a maior eficiência dessas empresas.

Risco – Varejo

E se empresas exportadoras e já estabelecidas são as que mais devem se valorizar na bolsa brasileira em 2022, aquelas voltadas essencialmente para o consumo doméstico devem patinar. A estrategista da XP, Jennie Li, aponta que o cenário é favorável a quem estiver exposto ao que acontece no exterior, mas desafiador para quem está mais exposto ao mercado doméstico e aos indicadores macroeconômicos, como inflação e juros. “O cenário é cauteloso para empresas associadas mais ao risco Brasil, o que as ações de varejo já vêm refletindo. Empresas de consumo, de forma geral, terão ano mais difícil dado o que está acontecendo na macroeconomia, com inflação acima de 10% e juros em alta, podendo chegar a 11,50% ano que vem. Isso traz um viés negativo”, diz Li.

O câmbio, por sua vez, deve ter um 2022 instável, seja pela preocupação com a pandemia lá fora, a recuperação econômica mundial ainda incerta, ou as eleições aqui dentro. Por isso, as empresas com receitas em dólar tendem a se beneficiar por estarem mais protegidas da volatilidade.

Risco – Cenário fiscal

Na opinião de Natal, do Itaú, o fato de a PEC dos Precatórios ter passado em dezembro no Congresso acabou sendo uma “boa notícia”, porque ela tira a chance de haver decreto de estado de calamidade, que abriria ainda mais espaço para o gasto público e deixaria o problema da incerteza iscal ainda maior. Ele lembra que isso já foi embutido na curva de juros futura, que inclinou para baixo na parte mais longa.

Mas isso não quer dizer que podemos deixar essa preocupação de lado. “Quem apostou na alta do dólar frente ao real teve uma performance muito boa em 2021. O principal motivo para ver o dólar se valorizando frente ao real foi o crescimento da incerteza e a deterioração do cenário doméstico. O fiscal se deteriorou no segundo semestre, e a articulação política do governo foi ruim diante de medidas tomadas e reformas pautadas para manter austeridade fiscal. Continuaremos em um cenário assim ano que vem, com as eleições”, comentou Panonko, da Toro.

Risco- Cenário internacional

Para Carvalho, do Bradesco,há três fatores que vão ditar o tom dos investimentos em 2022: crescimento, volatilidade e liquidez.

No primeiro caso, do crescimento, a expectativa dele é de que a economia global avance em torno de 4%, patamar pré-pandêmico. Mas não estão descartadas reviravoltas, uma vez que o avanço da ômicron já tem levado a problemas de produção em alguns países, e isso pode respingar por aqui em algum momento.

Vale ressaltar que a China segue sendo um importante agente de crescimento mundial e, em especial, para as empresas da bolsa brasileira. Se a covid avançar por lá, pode ser que novos fechamentos sejam decretados e isso interfira na recuperação da economia chinesa. É certamente, um país para acompanhar de perto.

Em segundo lugar, Carvalho diz que a volatilidade do mercado deve aumentar em 2022, dadas as incertezas sobre pandemia e do novo direcionamento do banco central americano, o Federal Reserve (Fed), de subir juros e retirar estímulos mais rápido do que se imaginava.

Por fim, a liquidez, que é a disponibilidade de dinheiro. “A liquidez dita o apetite ao risco do investidor internacional. Farta liquidez leva a maior apetite para investir em países emergentes, como o Brasil. Se a liquidez diminui muito com o aperto monetário [do Fed], o quadro pode se tornar perigoso”, afirma.

Li, da XP, complementa ao dizer que o aumento dos juros nos EUA é, por si só, um atrativo para investidores internacionais irem para lá. Além de significar rendimentos maiores do que os de hoje, é uma economia considerada mais segura. “Juros mais altos devem levar os investidores globais a irem aos EUA em busca de maior rendimento e tirarem fluxo de mercados emergentes. Isso tende a fortalecer o dólar frente ao real e outras moedas”, explica.

Outro ponto importante que ela destaca é o risco de estouro de uma possível bolha do mercado de ações americano. O S&P 500 teve 70 recordes de pontuação em 2021. “Tem gente já prevendo há um tempo que vai vir uma correção, mas ainda não veio. O ponto é que, se vir uma correção, a bolsa aqui corrige também”, disse ela ainda na virada do ano, antes de o índice americano apresentar os 7,7% de baixa que mostra em 2022 até sexta-feira.

Oportunidades – Histórias individuais

Todo ano há ações que se destacam por eventos próprios, como fusões, aquisições, novos projetos, venda de ativos, estratégia acertada de negócio, entre outras.

André Carvalho, do Bradesco, destaca entre as estratégias empresariais individuais que aposta a empresa de moda Arezzo, a de medicina Fleury, a de distribuição de combustível Vibra (BR Distribuidora) e a Santos Brasil. São empresas que, em sua visão, têm potencial de valorização independente do quadro econômico.

Fonte: Valor Investe

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