O preço está sempre certo?
28 de June de 2021O preço está sempre certo?
21/04/2021
Discussão sobre preço das ações extrapola em muito modelos tradicionais de precificação
Uma das atividades essenciais de analistas financeiros e gestores de recursos é descobrir o preço certo, ou justo, dos ativos. A grande pergunta a ser respondida é: este ativo está barato ou caro?
A lógica é simples. Para que se possa gerar retornos acima do mercado para as carteiras é preciso comprar ativos cujos preços estejam abaixo daqueles considerados justos. Se as premissas estiverem certas, as contas forem bem-feitas e não surgir nenhum fato inesperado, é esperar os preços subirem e alcançarem o tal valor justo. Nesse ponto, é aproveitar para vender e realizar o lucro esperado. Vale a ressalva: a lógica é fácil, mas a implementação está longe de ser simples, a começar pelo conjunto de premissas.
Nos últimos meses, temos assistido a uma intensa discussão sobre se os preços das ações não teriam subido demais após a eclosão da pandemia. Ou seja, se muitas ações não estariam com preços acima de seus valores justos.
Dito isto, fica claro que as dúvidas residem sobre a capacidade das empresas em gerar fluxos de caixa robustos no mundo pós pandemia e na longevidade das taxas de juros nos patamares atuais. Assunto para outro artigo.
Essa discussão me fez recordar do livro “Misbehaving”, de Richard Thaler, e sua deliciosa discussão sobre um dos pilares da teoria de finanças tradicional, ou de viés racional, a proposição de que “o preço está sempre certo”.
Thaler recorre a Keynes, economista considerado como pai da macroeconomia, e reconhecido por seus argumentos em defesa do uso, pelos governos, da política fiscal como indutor de demanda para abreviar os impactos das recessões.
Em seu livro “A teoria geral do emprego, do juro e da moeda”, publicado em 1936, Keynes compara gestores e investidores profissionais a participantes de uma competição em que os jogadores precisam escolher os seis rostos mais bonitos entre diversas fotos, ganha o prêmio o competidor que escolher o rosto mais próximo à média das preferências de todos os competidores. Esta era uma competição bastante comum nos jornais da época, que envolviam milhares de participantes.
Ou seja, independentemente de nossas opiniões e preferências, o que vale é conseguir antecipar o que a maioria considera como sendo o preço justo de uma ação.
Esse argumento de Keynes se alinha aos princípios da economia comportamental ao rechaçar o argumento de que os preços seriam simplesmente a expressão das negociações de mercado entre investidores racionais, cujas estimativas do valor intrínseco seriam fruto de metodologias teoricamente bem fundamentadas.
Para reforçar seu ceticismo acerca da racionalidade de mercado, Keynes recorre ao exemplo dos preços das ações de companhias de gelo, que eram mais altos nos meses de verão. Como nesta época do ano as vendas são altas, seus resultados são mais elevados, o que leva as pessoas também a projetar preços mais elevados.
Observando este fato pela lente da teoria tradicional, ele não faz o menor sentido. Os preços das ações refletem o valor da empresa no longo prazo e não deveriam sofrer influência das sazonalidades, conhecidas e já esperadas.
Um estudo publicado por Chang, Hartzmark, Solomon e Soltes em 2017, comprova as observações de Keynes. Eles confirmaram a hipótese de que empresas que historicamente produzem resultados mais robustos em determinado trimestre apresentam retornos mais elevados quando estes números são anunciados. Como consequência, no trimestre subsequente, quando o resultado naturalmente cai, o preço também acaba por refletir esta queda. As pessoas, ao que parece, atribuem pesos maiores a eventos recentes.
Fonte: Valor Investe